terça-feira, 11 de novembro de 2008

MATÉRIA PUBLICADA NO SITE COMUNIQUE-SE

Assédio moral: um inimigo invisível, matéria produzida por alunos do Curso de Jornalismo da Faculdade Integrada da Grande Fortaleza - CE

Sonara Capaverde: professora responsável
Alunos: Amanda Ávila, Bruno de Castro, Cely Fraga e Lilian Fonsêca.
Reportagem: Amanda Ávila e Lilian Fonsêca.
Edição: Bruno de Castro e Cely Fraga.

Humilhações, constrangimentos, menosprezo através de condutas abusivas por meio de gestos, palavras e comportamentos. Durante mais de um ano, este foi o cenário que a estudante de Jornalismo, M.L.T, 24, encontrou numa instituição em que fazia estágio. "A pessoa que devia orientar me chamava de irresponsável e usava várias expressões pesadas para se referir aos meus trabalhos", diz. Assim como M.L.T, vários outros universitários ou profissionais assistiram ou vivenciaram situações de assédio moral, um tipo de agressão recorrente dentro do ambiente de trabalho há décadas e que preocupa especialistas e governantes.

Sobre o assédio Na sua definição empírica, assédio moral significa importunar, humilhar, menosprezar ou constranger trabalhadores, voluntários, aprendizes ou quaisquer outras formas de vínculo entre empresa e contratado.

"Foi detectado um grampo na linha do meu telefone residencial"

Quando efetivada, a prática do assédio adentra em campos delicados como a integridade física e/ou mental da pessoa agredida. Desta forma, ela pode ameaçar o emprego ou modificar negativamente o clima de trabalho. Estas condutas geralmente são observadas em relações hierárquicas, podem ser praticadas por mais de um agressor e voltadas para mais de um subordinado de forma repetida e prolongada. Como conseqüência, a evolução deste quadro pode gerar a incapacidade de produção e/ou o desemprego. É o caso da funcionária pública A.F.R., de 38 anos. Ela sofreu os efeitos da violência moral: foi acusada de problemas internos numa organização e chegou a ser impedida de entrar no local de trabalho. Foi perseguida, e recebia recados anônimos com ameaças. "Furaram os pneus do meu carro, ligações estranhas eram registradas em meu celular. Foi detectado um grampo na linha do meu telefone residencial", desabafa.

Na maioria dos casos, o assediado é marginalizado pelos companheiros que presenciam o constrangimento. Eles evitam o contato muitas vezes por medo de perder o emprego. Com isto, o contratado não consegue apoio, o trabalho se torna estressante e a relação com os colegas vira um verdadeiro constrangimento. A economista doméstica de 28 anos, M.H.F, também foi assediada quando trabalhava numa empresa do ramo de alimentação. "Tinha uma colega que se sentia superior a mim por ganhar um salário maior, mas que exercia a mesma função que eu. Ela me rebaixava, me subjugava, não aceitava minhas idéias e opiniões. Isto acontecia, muitas vezes, na frente de vários funcionários e todos me olhavam diferente", afirma.

Sintomas freqüentes nos assediados
Quem sofre violência moral pode desenvolver desde dores de cabeça a problemas psicológicos. Os sintomas são variados e homens e mulheres reagem de forma diferente. "As mulheres são as que mais desenvolvem crise de choro, sofrem de palpitações, tremores, insônia, depressão e diminuição da libido. Já no homem, os sintomas são depressão, insônia, alcoolismo e a tendência ao suicídio", esclarece o médico do trabalho, Gilbert Rocha. "Tomo medicamentos há vários anos. Vivo com medo, tenho insônias, pânico de sair de casa e dores de cabeça diárias", diz a funcionária pública A.F.R.

Alvos preferenciais Mulheres, negros, homossexuais, pessoas idosas, estudantes (estagiários) e o trabalhador vítima de acidente do trabalho cuja estabilidade é assegurada pela Previdência Social são os alvos preferidos por parte do agressor.

"Por não sermos funcionários registrados e sim estagiários, somos humilhados"

De acordo com as orientações contidas num manual produzido pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), as atitudes mais comuns de assédio moral são: instruções confusas e imprecisas ao contratado; sobrecarga de tarefas; exposição de críticas ou brincadeiras de mau gosto em público; imposição de horários sem justificativas; agressão física ou verbal quando estão sós assediador e vítima; restrição ao uso de sanitários; ameaças; insultos; e isolamento.

No caso dos estagiários, o processo é mais delicado. Em aprendizagem, os estudantes chegam às empresas com o intuito de aperfeiçoar as técnicas vistas em sala de aula. Porém, pelo fato de não serem profissionais, a pressão, em alguns casos, acaba aumentando. "Por não sermos funcionários registrados e sim estagiários, somos humilhados como se não soubéssemos o serviço, sendo que o desempenhamos igual, ou melhor, do que os próprios funcionários" (Mulher, estagiária).

Na tentativa de um acompanhamento pedagógico mais preciso e com menos margem ao assédio, os cursos de comunicação se posicionam de modo preventivo. "Aqui na faculdade, existe, além da coordenadora convencional, uma profissional contratada especificamente para exercer a atividade de orientação e acompanhamento dos alunos que fazem o estágio curricular", afirma o jornalista e coordenador do curso de jornalismo da FGF, Paulo Nogueira.

Outra saída é a formalização de denúncia no sindicato da categoria ou na Delegacia Regional do Trabalho (DRT). Depois disto, assediado e assediador entram na fase de mediação junto à DRT, que pretende com isto prevenir e conscientizar ambas as partes sobre seus direitos e deveres. Caso não haja acordo, o processo é encaminhado à Procuradoria ou à Justiça do Trabalho.

"Vivo com medo, tenho insônias, pânico de sair de casa e dores de cabeça diárias"

Legislação No Brasil, ainda não existe uma lei nacional para este tipo de assédio. O Rio de Janeiro foi o primeiro Estado a aprovar uma lei estadual que condena a prática (Lei nº 3921, de 23 de agosto de 2002). No Ceará, há dois projetos de lei (n.º 5970/01 e 5971/01) de autoria do deputado federal Inácio Arruda (PC do B-CE) que abordam o tema e esperam aprovação na Assembléia Legislativa (AL). As ementas qualificam o assédio como crime, tratam do direito de nulidade do contrato por parte do empregado em caso de repressão moral e obrigam o empregador a pagar todos os direitos trabalhistas.

De acordo com o advogado Carlos Eduardo Paz, os assediadores não são julgados pela Constituição das Leis do Trabalho (CLT), porque a CLT não tem fundamentação sobre assédio e sequer traz uma linha em seu texto sobre este tipo de agressão. "Para tentar trazer algum benefício financeiro (indenizações) para as vítimas, os juízes e tribunais se baseiam no artigo 5º da Constituição Federal, que afirma que 'deve-se respeitar a dignidade humana e que ninguém será submetido a tratamento desumano ou degradante'", diz.

O assediador de um ponto de vista psicológico O assédio moral no trabalho, como um padrão de comportamento, deve-se a uma série de fatores, como: traços de personalidade, problemas na vida pessoal, entre outros. De acordo com psicólogo Robson Façanha, ao se estabelecer um perfil psicológico dos "assediadores", corre-se sempre o risco de generalizações. "Mesmo assim, pode-se dizer que pessoas que praticam assédio moral possuem uma baixa auto-estima, possuem dificuldades em lidar com suas próprias emoções e sentem necessidade de se firmar através deste tipo de agressão. Desta maneira, entende-se que existem fatores no comportamento do assédio moral que, na realidade, não estão no indivíduo, mas sim no contexto global em que acontece", diz. "Há também um componente sádico, que torna tal comportamento prazeroso para quem o pratica. Relações conflituosas na infância com as figuras de autoridade (pai e mãe) também são comuns nestas pessoas", conclui.

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